O meu sonho flutuava no azul, no éter infinito onde o tempo e o espaço já não existem.A Indochina seduziu muitos colonos. Era quente, era exótica, consentia liberdades de comportamento e de sexo que agradavam a europeus de tendências reprimidas; permitia a muitos uma desenvoltura de meios materiais dificilmente alcançável no solo natal.E tinha ópio ao virar de cada esquina, aberto, tolerado como costume entre os anamitas, visto com olhos meio fechados pelo poder francês. […]Paraíso artificial, chamou-lhe Baudelaire, oculto na flor das papaver somniferum, as papoilas que a irmã de Rimbaud fervia no chá e lhe abrandavam as dores do cancro terminal […]Jules Boissière [n. 12 de Abril de 1863, em Clermont-l’Hérault] tinha vinte e quatro anos de idade quando partiu em 1886 para a Indochina como secretário de Paulin-Alexandre Vial, representante do governo em Annam e Tonquim.O sonho do Oriente, nessa época exacerbado pela cultura europeia, o que dava solas de vento a Rimbaud, excitava Flaubert, Gautier, Nerval, Loti e Farrère, fez-se-lhe irrecusável quando o seu pai abandonou por outra aventura o lar conjugal e graves dificuldades financeiras surgiram.[…] Diário de um Fuzilado destaca-se pela intransigência da sua recusa ao politicamente correcto. Se Palavras de um Fumador de Ópio apenas nos revela a experiência pessoal do autor na sua relação com a droga, a personagem central do Diário é ficcionada nesta mesma relação com um soldado elitista e xenófobo que deserta do exército francês e se introduz no exército rebelde anamita, não por aprovar a luta desses colonizados contra o poder imperialista, mas saber que poderá nas suas fileiras fumar ópio sem as punições que o exército do seu país lhe destina para o dissuadir do vício.[…]Jules Boissière morreu subitamente no dia 12 de Agosto de 1897, aos trinta e quatro anos de idade, com uma oclusão intestinal provocada pela maldade dos trópicos e pelo ópio. E teve tempo, nessa agonia violenta, de dizer que desejava ficar sepultado num cemitério de Hanói. […] tinha em Paris um incondicional amigo - Stéphane Mallarmé, o que lhe tinha influenciado no tom e nos artifícios os primeiros versos.[Aníbal Fernandes]
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